Razão de viver - Camus

Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio. Julgar se a vida merece ou não ser vivida, é responder a uma questão fundamental da filosofia. O resto, se o mundo tem três dimensões, se o espírito tem nove ou doze categorias, vem depois. São apenas jogos; primeiro é necessário responder. (...)
Se pergunto a mim próprio como decidir se determinada interrogação é mais premente do que outra qualquer, concluo que a resposta depende das acções a que elas incitam, ou obrigam. Nunca vi ninguém morrer pelo argumento ontológico. Galileu, que possuía uma verdade científica importante, dela abjurou com a maior das facilidades deste mundo, logo que tal verdade pôs a sua vida em perigo. Fez bem, em certo sentido. Essa verdade não valia a fogueira. Qual deles, a Terra ou o Sol, gira em redor do outro, é-nos profundamente indiferente. A bem dizer, é um assunto fútil. Em contrapartida, vejo que muitas pessoas morrem por considerarem que a vida não merece ser vivida. Outros vejo que se fazem paradoxalmente matar pelas ideias ou pelas ilusões que lhes dão uma razão de viver (o que se chama uma razão de viver é ao mesmo tempo uma excelente razão de morrer). Julgo pois que o sentido da vida é o mais premente dos assuntos ― das interrogações.
Albert Camus, O Mito de Sísifo, pp. 13-14