O Conhecimento como actividade construtiva - Kant

Para ultrapassar a incompatibilidade das abordagens racionalista e empirista do conhecimento, Kant estabeleceu a sua posição no que veio a designar como “revolução copernicana” no domínio da metafísica: seguindo os passos de Copérnico - que ‘não podendo prosseguir na explicação dos movimentos celestes enquanto admitia que toda a multidão de estrelas se movia em torno do espectador, tentou ver se não daria melhor resultado fazer antes girar o espectador e deixar os astros imóveis’, propõe que o conhecimento deixe de se guiar pela “natureza dos objectos”, passando, pelo contrário, a ser o objecto regulado pelas faculdades cognitivas do sujeito, o que significa ver no conhecimento não uma mera competência passiva, mas uma actividade construtiva regida por leis próprias. 
Kant vai proceder à uma tentativa de “autonomia da razão”, isto é, esclarecer em que limites ela é ou não dependente do recurso à experiência e de estruturas a priori, ocupando-se assim mais do modo de conhecer os objectos do que propriamente destes. É com a experiência que todo o nosso conhecimento começa. Ela é necessária para estimular as nossas faculdades cognitivas e estruturas a priori. Apesar de ter início com a experiência, nem todo o conhecimento se produz através dela, existe o conhecimento a priori.
Todos os seres humanos possuem as seguintes estruturas/faculdades cognitivas: Sensibilidade - é a capacidade de receber informações através dos sentidos; é o elemento de receptividade. É graças a ela que produzimos intuições (conhecimentos imediatos); Entendimento - é a capacidade de produzir conhecimento através do pensamento; é o elemento de espontaneidade. É através dele que produzimos conceitos (conhecimentos mediatos); Razão - é a capacidade de pensar em termos metafísicos, que ultrapassam a experiência. É o pensar através de ideias. 
Partindo da distinção entre juízos analíticos - juízos universais e necessários nos quais o predicado se encontra contido nas determinações do sujeito, pelo que nada lhe acrescenta -, juízos sintéticos - aqueles em que o predicado acrescenta uma nova determinação ao sujeito, embora a sua origem empírica os destitua de universalidade - e juízos sintéticos a priori - os que, fundamentando-se numa síntese a priori (não empírica), permitem acrescentar novas determinações ao sujeito sem, no entanto, deixarem de ser universais e necessários -, conclui que só os últimos asseguram um autêntico progresso do saber e que neles reside o princípio de possibilidade de todo o conhecimento científico. […] No entanto, os juízos, produzidos pelo entendimento, operam sobre conteúdos que, enquanto seres humanos, só podemos intuir através da sensibilidade, única faculdade capaz de gerar em nós representações e que, por isso, deverá ser considerada como fonte inicial do conhecimento (dos dados fenoménicos). É na Crítica da Razão Pura (1781 e 1787) que Kant irá esclarecer em que medida estão presentes, quer na sensibilidade quer no entendimento, os elementos a priori que podem transmitir a universalidade e a necessidade aos juízos sintéticos (Diciopédia, 2002). 
Existem estruturas a priori presentes em todas as faculdades cognitivas, uma vez que a mente tem de possuir categorias de forma a poder compreender ‘a massa não-interpretada’ (Wikipedia contributors, 2006). ‘As formas a priori da Sensibilidade são o tempo e o espaço pois Kant considera que não são dados da experiência nem conceitos nem se encontram de alguma maneira nas coisas.’. No Entendimento são os conceitos que são elementos a priori do entendimento, estes permitem aos objectos serem pensados. Destes conceitos Kant elabora as ‘categorias puras do entendimento’, por exemplo a categoria da causalidade. São as intuições da sensibilidade que dão conteúdo aos conceitos do entendimento; são os conceitos do entendimento que permitem interpretar as intuições da sensibilidade. Na Razão existem as ideias a priori, por exemplo a ideia de Deus. ‘Podemos então construir dois tipos de conhecimento: o conhecimento a priori (independente da experiência; ex: “Os elefantes são grandes.” – apliquei a categoria da substância) e o conhecimento empírico (produzido a partir da experiência) . As categorias do entendimento são aplicadas às formas puras (a priori) da sensibilidade (espaço, tempo). 
Kant define que só podem ser consideradas como objecto de conhecimento as representações com origem nas intuições sensíveis cuja actividade apenas se refere ao fenómeno - coisa que está para outra coisa, manifestação do númeno mas que apenas nos dá uma ideia do númeno. É a realidade captada pelo sujeito submetida às suas estruturas a priori (espaço, tempo, categorias). É conhecido pela sensibilidade e entendimento. O númeno, por sua vez, é a “coisa em si”, o mundo informe. É apenas conhecível indirectamente, não há possibilidade de conhecer alguma vez a realidade em si pois passará sempre pelo “filtro” dos sentidos. É o objecto independente do sujeito e das suas estruturas a priori. Nunca temos acesso a ele e não pode ser conhecido, só pode ser pensado. ‘É o que o espírito concebe para além do fenómeno mas não pode abranger’ . É pensado através das ideias da Razão. Se Kant interroga-se sobre os limites do conhecimento possível, propondo um conhecimento que tenha em conta a experiência e simultaneamente a luz da Razão, então se mudarmos “a nossa experiência”, a maneira como sentimos e percepcionamos (receptividade), mudaremos a nossa maneira de pensar no Mundo, nas coisas tanto abstractas como concretas, mudaremos os nosso entendimento e “nossa” razão pois estaremos a abrir novas entradas de conceitos, que de um modo ou de outro podem dar conhecimento. No entanto, é frequente consideramos uma ilusão as experiências para as quais não temos explicação, ou seja, em que se revelam incompatibilidades com as experiências já feitas. ‘ Não podemos falar de uma nítida distinção entre as experiências perceptivas e as ilusões: se considerarmos que as ilusões consistem em percepcionar o mundo como algo de diferente do que ele é realmente, todas as percepções serão ilusórias ' . Se assim é, nunca sentiremos o estado puro das coisas? O Homem está condenado a viver no mundo dos fenómenos, salvo se se ‘induzir um estado modificado de consciência', isto é, se uma pessoa modificar o seu estado de percepção da realidade, como na meditação ou os chamados estados de “transe” pela ingestão de drogas, por exemplo.

Teresa Simões in http://barcode.egedsoft.com