O sistema ternário dos ensinos básico e secundário

Acabo de ler o artigo “Escolas públicas, vidas privadas”, saído no PÚBLICO (12/06/2016), da autoria de Manuel Carvalho, com o qual me identifico, quase diria por completo, reconhecendo-lhe o mérito de perspectivar esta temática para além do binário ensino oficial/ensino convencionado com a achega do ensino privado.
Aliás, no meu longo deambular em quatro artigos de opinião neste jornal sobre uma polémica que está longe de terminada, titulei um deles: “Ensinos oficial, convencionado e privado” (13/11/2013). Nele chamava a atenção para o ensino privado, da forma seguinte: “Em plena época de grave crise económica, promover uma situação de favor para o ensino privado subsidiado pelos cofres do Estado, poderá ser uma forma de transformar o ensino privado, com longa e valiosa tradição (em minha lembrança e a título de mero exemplo, o Colégio Valssassina de Lisboa, membro-honorário da Ordem de Instrução Pública) num barco em perigo de adernar por, em nome da sua independência, dispensar quaisquer formas de subsídios estatais. Salvo melhor opinião, reduzir esta questão ao binário, ensino oficial/ensino privado convencionado pode ter como consequência trágica ferir de morte o ensino privado, tout court”.
Entretanto, não posso deixar de estranhar que se tenha tentado criar o mito de que a esquerda tem estado de alma e coração em defesa de um ensino oficial verdadeiramente dignificado. Aduzo, também, o facto de a Fenprof, pouco preocupada com a exigência na formação dos professores, se apresentar tardiamente (isto é, quando o final de alguns contratos de associação estão anunciados formalmente), apenas como apoio logístico da mega manifestação do próximo dia 18 deste mês em defesa da escola pública. Por seu turno, o Partido Socialista, como partenaire do PSD, está longe, bem pelo contrário, de sair sem mácula na criação, nem sempre justificada, dos primeiros contratos de associação. E, por outro lado, acresce terem sido no consulado de José Sócrates construídas escolas oficiais faraónicas (apesar da diminuição da população escolar), enquanto paredes-meias antigos e prestigiados liceus viam as paredes a abrir brechas e a chover dentro das salas de aulas. Ora, se, como diz o povo, águas passadas não movem moinhos, devemos, portanto, saudar a coragem da secretária de Estado “Alexandra Leitão se ter tornado o rosto do combate contra a continuação dos contratos de associação” (Manuel Carvalho).
Claro que numa sociedade ideal, que está longe de ser a nossa, como disse Jean Jaurès, “atingir o ideal é compreender o real”, deveria haver, mas não há, toda a possibilidade em os pais poderem inscrever os filhos, onde quisessem fazê-lo, mas sem ser à custa do erário público, o dinheiro dos impostos de todos nós, por vezes, em mera satisfação megalómana de famílias mais ou menos abonadas que gostam de blasonar terem os filhos a estudar em colégios privados. Justiça seja feita a Alexandra Leitão, que paga do seu bolso os custos de ter duas filhas suas a estudar no Colégio Alemão.
Esta a diferença não despiciente entre estas duas situações. Ou seja, quem quer luxos deve-os pagar não se tornando parasita de uma economia em que os pobres estão cada vez mais pobres e os ricos cada vez mais ricos.
Rui J. Baptista in publico.pt