Perigos do progresso científico - 3 entrevistas a Rómulo de Carvalho (António Gedeão)

Rómulo de Carvalho
(António Gedeão)
Jornal de Letras - Costuma dizer que a evolução da sociedade o desiludiu. Em contrapartida, a evolução da Ciência tem-lhe dado algum conforto?
Rómulo de Carvalho - Não posso falar propriamente de conforto, porque a Ciência também tem os seus perigos. Mas claro que o desenvolvimento científico tem sido notabilíssimo.
JL - A que perigos se refere?
RC - O perigo está no proveito que os outros possam tirar dos progressos que a Ciência vai conseguindo. Até vemos na televisão esses homens do Burundi, daqueles países africanos, que lutam uns com os outros de uma forma quase primitiva, mas muito bem armados. Já têm todas essas coisas que são, evidentemente, resultado dos progressos da Ciência. Como homens, continuam a ser, contudo, os mesmos que eram os seus antepassados. Os mesmos que nós somos. A Humanidade conserva-se igual a si mesma.
JL -Houve alguma descoberta científica recente que o tenha impressionado particularmente?
RC - Todas essas descobertas no campo da Física e da Astronomia. Os processos modernos, que permitem ver cada vez mais longe, imaginando como é que o universo se organizou e se expande. Isso impressiona imenso (o olhar ilumina-se). O que seria o Universo? E nós, que temos tendência a acreditar que tudo tem um princípio- essa é a base da religião.
in Jornal de Letras, Ano XVI, nº 680, 6 a 19 de Novembro, 1996

Expresso - A ciência não procura a verdade?
Rómulo de Carvalho - Isso parte de um conceito seu. Onde é que está essa verdade? Quer coisa mais segura que a teorias de Newton sobre a gravidade? O nosso pensamento não pode sair da limitação que nos foi imposta pela natureza. Todos os dias se descobrem mais estrelas. E depois? O comum das pessoas pensa que as coisas têm de ter um limite: o limite é onde termina o que conhecemos.
In Jornal Expresso, Lisboa, 4 de Junho de 1994

Diário de Notícias- Não temos um processo evolutivo da Ciência? Não existe esperança?
Rómulo de Carvalho- Quem a puder ter que a tenha. Eu não tenho esperança numa melhoria social.
In Jornal Diário de Notícias, Ano 131, nº 46006, 9 de Março de 1995