De ateu a deísta - Antony Flew

"Antony Flew nasceu em Londres, em 1923, e foi professor em Oxford e noutras grandes universidades. O seu ateísmo tornou-se lendário - "Theology and falsification", de 1955, foi, segundo alguns, o artigo filosófico mais lido da segunda parte do século XX. Por isso, a sua conversão, em 2004, foi tão polémica. O livro que a explica, "There is a God: How the World's Most Notorious Atheist Changed His Mind" (Harper, 2007), foi best-seller e semeou um debate filosófico intenso. Flew, que tinha sido mais sensível aos argumentos científicos do que aos metafísicos, baseou a sua mudança nas descobertas recentes da cosmologia e da física. Destacava o big bang e a ideia de que as constantes da física estavam "finamente sintonizadas" para permitir o surgimento da vida.
Tudo isto tornou Flew num dos filósofos contemporâneos mais conhecidos. Mas a minha admiração pelo pensador inglês vem de outras polémicas e de outros tempos. Nos anos 60, a dita "nova sociologia do conhecimento" e a dita "nova sociologia da educação" começaram a afirmar que todo o conhecimento é socialmente construído e que a educação deve deixar de se preocupar com a transmissão de conhecimentos pretensamente absolutos e questionar o saber.
(...) Boas razões para ler, ou reler, Antony Flew."
in: http://aeiou.expresso.pt

Entrevista de Habermas a Flew
(Português do Brasil)

"HABERMAS: Você recentemente me disse que passou a acreditar na existência de Deus. Você poderia comentar sobre isto?

FLEW: Bem, eu não acredito no Deus de nenhuma revelação especial, embora eu esteja aberto a esta possibilidade. Mas parece a mim que a defesa de um Deus Aristotélico que possua as características de poder e inteligência, é agora muito mais poderosa do que parecia ser antes. E foi de Aristóteles que São Tomas de Aquino buscou material para produzir suas Cinco Vias de, esperançosamente, provar a existência de seu Deus. Aquino pegou estas fontes, suficientemente racionais, para provar (se provam alguma coisa) a existência do Deus da revelação cristã. Mas o próprio Aristóteles nunca produziu uma definição para a palavra “Deus”, o que é um fato muito curioso. Mas este conceito ainda nos leva aos básicos elementos das Cinco Vias. Parece a mim que da existência do Deus de Aristóteles você não pode inferir nada sobre o comportamento humano. Assim, o que Aristóteles tinha a dizer sobre justiça (justiça, claro, como concebido pelos Pais Fundadores da república americana como oposição à “justiça social” de John Rawls) era uma idéia muito humana, e ele achava que esta idéia de justiça era que deveria governar o comportamento individual dos seres humanos em suas relações com os outros.

HABERMAS: Você uma vez me disse que sua visão poderia ser chamada “Deísmo”. Você acha que esta seria uma designação justa?

FLEW: Sim, absolutamente. O que deístas, como o Sr. Jefferson, que rascunhou a Declaração da Independência americana, acreditam é que, ao mesmo tempo em que a razão, principalmente na forma de argumentos do Design, nos assegura que Deus existe, também não há espaço para qualquer revelação sobrenatural ou transações entre este Deus e seres humanos.

HABERMAS: Sendo assim você poderia comentar sua “abertura” para a noção da revelação teísta?

FLEW: Sim. Eu estou aberto a esta possibilidade, mas sem entusiasmo para a potencial revelação de Deus. Do um lado positivo, por exemplo, eu estou muito impressionado com os comentários do físico Gerald Schoroeder sobre o primeiro capítulo de Gênesis. Se o relato bíblico puder ser cientificamente demonstrado, isto levanta a possibilidade de que se trata de uma revelação.

HABERMAS: Você muito gentilmente disse que nossos debates e discussões influenciaram sua mudança em direção ao teísmo. Você mencionou que esta influência inicial contribuiu em parte para seu argumento de que os esforços naturalistas nunca tiveram sucesso em produzir “uma conjectura plausível de como qualquer destas moléculas complexas puderam ter se envolvido sendo entidades simples”. Em sua recente nova introdução para a reedição do livro God and Philosophy [Deus e Filosofia], você disse que a versão original do livro encontrava-se obsoleta. Você menciona um número de pontos na argumentação teísta que você considera convincente, como a cosmologia e o Big Bang, o fino ajuste do universo e os argumentos a favor do Design Inteligente. Quais argumentos a favor da existência de Deus você considera mais persuasivos?

FLEW: Eu acho que os argumentos mais impressionantes para a existência de Deus são aqueles que são baseados em descobertas científicas recentes. Eu nunca fiquei muito impressionado pelo argumento cosmológico kalam, e não acho que ele tenha melhorado nem um pouco atualmente. Entretanto, eu acho que o argumento do Design Inteligente está incrivelmente mais forte do que ele estava quando o vi pela primeira vez.

HABERMAS: Então você prefere aqueles argumentos que procedem da cosmologia do Big Bang e do ajuste fino no universo?

FLEW: Sim.

HABERMAS: Você recentemente me disse que não considera o argumento moral muito persuasivo. Estou certo?

FLEW: Sim, está. Eu penso que para se ter um argumento moral forte, você tem que ter Deus como a justificação para a moralidade. Para isto você tem que considerar o bem moral uma questão puramente de prudência além de, como os filósofos morais de minha juventude chamavam, um bem em si mesmo."

Tradução: Eliel Vieira in: http://elielvieira.org