
2. Os dois termos da relação não podem ser separados dela sem deixar de ser sujeito e objecto. O sujeito só é sujeito em relação a um objecto e o objecto só é objecto em relação a um sujeito. Cada um deles apenas é o que é pela sua relação com o outro. Estão ligados um ao outro por uma estreita relação; condicionam-se reciprocamente. A sua relação é uma correlação.
3. A relação constitutiva do conhecimento é dupla, mas não é reversível. O facto de desempenhar o papel de sujeito em relação a um objecto é diferente do facto de desempenhar o papel de objecto em relação a um sujeito. No interior da correlação, sujeito e objecto não são, portanto, intermutáveis; a sua função é essencialmente diferente. (…)
4. A função do sujeito consiste em apreender o objecto; a do objecto em poder ser apreendido pelo sujeito e em sê-lo efectivamente.
5. Considerada do lado do sujeito, esta «apreensão» pode ser descrita como uma saída do sujeito para fora da sua própria esfera e como uma incursão na esfera do objecto, a qual é, para o sujeito, transcendente e heterogénea. O sujeito apreende as determinações do objecto e, ao apreendê-las, introdu-las, fá-las entrar na sua própria esfera.
6. O sujeito não pode captar as propriedades do objecto senão fora de si mesmo, pois a oposição do sujeito e do objecto não desaparece na união que o acto de conhecimento estabelece entre eles; antes permanece indestrutível. A consciência desta oposição é um aspecto essencial da consciência do objecto. O objecto, mesmo quando é apreendido, permanece, para o sujeito, algo de exterior; é sempre «o objectum», quer dizer, o que está diante dele. O sujeito não pode captar o objecto sem sair de si (sem se transcender); mas não pode ter consciência do que é apreendido, sem reentrar em si, sem se reencontrar na sua própria esfera. O conhecimento realiza-se, pois, por assim dizer, em três tempos: o sujeito sai de si, está fora de si e regressa finalmente a si.
7. O facto de que o sujeito saia de si para apreender o objecto não muda nada neste. O objecto não se torna por isso imanente. As características do objecto, se bem que sejam apreendidas e como que introduzidas na esfera do sujeito, não são, contudo, deslocadas. Apreender o objecto não significa fazê-lo entrar no sujeito, mas sim reproduzir neste as determinações do objecto numa construção que terá um conteúdo idêntico ao do objecto. Esta construção operada no conhecimento é «a imagem» do objecto. O objecto não é modificado pelo sujeito, mas sim o sujeito pelo objecto. Apenas no sujeito alguma coisa se transforma pelo acto de conhecimento. No objecto nada de novo é criado; mas no sujeito nasce a consciência do objecto, com o seu conteúdo, a imagem do objecto.
(Nicolai Hartmann ,Les Principes d’une Métaphysique de la Connaissance, vol. 1, pp. 87-88.)