Ciências de Referência
Todos as definições genéricas sobre ciência continuam a repetir invariavelmente
conceitos extraídos das denominadas ciências experimentais, entre as quais se
destaca a física. Quando no século XVII a física se tornou numa ciência
experimental, os seus métodos tornaram-se o padrão para as restantes
ciências. No século XIX, o positivismo consagra esta concepção. Os
conhecimentos da física são considerados como proposições
sobre a totalidade da natureza. Muitas vezes proclama-se que uma
verdadeira filosofia deve ser uma ciência natural. Esta concepção encontra-se
totalmente ultrapassada.
O grande objectivo das ciências experimentais é dar por meio de conceitos
apropriados e deduzidos da experiência, uma representação mental dos processos
que objectivamente se desenrolam na natureza.
A Importância do Método na Ciência
A objectividade do conhecimento científico é desde o século XVI,
associado ao rigor do método de investigação utilizado. Nas ciências
experimentais, o método assenta, em termos correntes, em quatro fases
fundamentais: Observação, Hipótese, Experimentação e Formulação de leis:.
Observação
O cientista não tem uma atitude passiva face aos fenómenos, dado que não se
limita a registar factos. Pelo contrário a observação científica implica:
- Uma selecção dos dados a observar em função de um dado modelo teórico que
o cientista já dispõe, que determina o que deve ser observado e como deve ser
observado. Neste sentido uma observação é já uma interpretação. O essencial é
separado do acessório, unificando-se a diversidade empírica.
- A observação pode dar origem a múltiplas experiências cuja finalidade é
proporcionar uma melhor observação dos fenómenos em condições controladas.
- A observação é mediatizada por instrumentos (microscópios, telescópios,
etc), mas também por uma linguagem específica( a matemática, por exemplo) que
permite conferir maior rigor à recolha de dados. É interessante verificar que o
aparecimento da ciência moderna coincide com o aparecimento de inúmeros
instrumentos de medida.
Hipótese
Trata-se do momento inventivo da investigação. Uma hipótese é uma
explicação provisória sobre as relações entre dois ou mais fenómenos. É
costume afirmar-se que estas explicações são obtidas através de induções e de
deduções.
- Após ter observado as relações ou as propriedades comuns a vários
fenómenos da mesma espécie, através de um raciocínio indutivo extraí-se uma
lei comum. Galileu, por exemplo, após ter realizado várias experiências de
queda de corpos supôs que todos os corpos caem ao mesmo tempo,
independentemente do seu peso.
- Para controlar a validade e a generalidade destas relações, formula-se a
hipótese da sua generalidade, através de um raciocínio dedutivo,
procurando-se extrair as consequências destas relações. Estabelece-se então um
teoria científica.
-Uma hipótese considera-se adequada quando cumpre algumas condições, tais
como: a) ser compatível com os factos estudados; b)Ser coerente com outras
hipóteses anteriormente admitidas; c)Permitir que se façam observações ou
experiências que a confirmem ou refutem;
Experimentação
Trata-se de "testar" a hipótese na sua máxima
generalidade em condições controladas. No caso da hipótese ser
refutada pela experiência, volta-se ao início do processo.
Formulação de leis
Confirmada a hipótese na sua máxima generalidade, pode então formular-se
uma lei. O princípio base de uma lei é a sua universalidade, enunciada da
seguinte forma: sempre que nas mesmas circunstâncias ocorram as mesmas causas,
produzir-se-ão os mesmos efeitos.
O método experimental (indutivista) tem sido
objecto de várias críticas...
David Hume foi o primeiro a colocar em causa a
legitimidade deste método para a partir da observação de casos singulares e
particulares extrair leis gerais e universais. Não podemos legitimar a passagem
de casos particulares a leis universais. A conclusão indutiva não é
logicamente irrefutável.
Experiências
passadas não podem comprovar situações que ainda não ocorreram, como acontece
nas leis científicas. Ex. Por o Sol ter surgido ontem, não podemos ter a
certeza absoluta que amanhã esta ocorrência se venha a verificar. Neste
sentido, o conhecimento cientifico é apenas probabilístico não absoluto.
Karl Popper considera
o indutivismo como um mito que contamina as ciências da natureza. A prática
cientifica é diversa da concepção teórica sobre os procedimentos seguidos na
investigação.
Ao contrário do que
se afirma, os cientistas não partem de observações, mas de
problemas.
Os cientistas
partem sempre de conhecimentos ou expectativas quando estudam um dado problema.
As observações não são puras, estão impregnadas de teorias, conceitos,
expectativas, etc.
A observação
apresenta-se assim como um confronto entre as suas expectativas e teorias dos
cientistas e os factos observados, gerando novos problemas. Nem tudo o que se
pensava sobre caso é corroborado pela observação.
À semelhança de
Hume, questiona que a indução possa servir de elemento de prova. Não é possível
logicamente extrair de um conjunto de observações particulares, um princípio de
alcance universal, isto é, aplicável às restantes observações que não foram
feitas.
Método
Hipotético-Dedutivo:
1. Os problemas são
o ponto de partida da investigação cientifica;
2. Perante um
problema criam-se hipóteses (conjecturas), isto é, prováveis
soluções do mesmo;
3. Deduzem-se em
seguida consequências da hipótese;
4. Testam-se depois
as consequências, recorrendo, por exemplo, a observações e experiências. O
objectivo é verificar se as mesmas são incompatíveis com a hipótese
(falsificabilidade);
5. Esta
verificação das consequências não nos garante que a hipótese esteja certa, mas
apenas nos permite verificar a sua compatibilidade com as consequências dela
deduzidas. Se as mesmas não superarem os testes, a hipótese estará
"falseada" ou "refutada". Se superar estará corroborada,
isto é, confirmada provisoriamente.
6. O conhecimento
científico é hipotético e provisório, não é definitivo.
O que distingue o
conhecimento científico de outros tipos de saber é que o mesmo não depende do
procedimento indutivo, mas assenta no princípio da falsificação (refutação)
empírica (através da experiência) das proposições.
O conhecimento
cientifico é refutável.
"As
teorias mais válidas nunca são teorias verdadeiras, mas apenas teorias que
ainda não são falsas", Jean Baudouin, Karl Popper.
Carlos Fontes in: http://afilosofia.no.sapo.pt