Mil novecentos e oitenta e quatro - Apontamento de preparação para o visionamento do filme


«Estamos a viver num mundo onde ninguém é livre, no qual dificilmente alguém está seguro, sendo quase impossível ser honesto e permanecer vivo.» George Orwell, The Road to Wigan Pie

A simples crítica à racionalidade em Mil novecentos e oitenta e quatro de George Orwell é mesmo ultrapassada, chegando de certa forma a atingir extremos. 1984 é um assustador retrato de uma Inglaterra futura subjugada às mãos de um tirano, o Big Brother, caracterizado por um olhar sempre atento e punidor. Todos são constantemente vigiados pelos sempre presentes telescreens!
1984 é o prelúdio assustador do que seria uma sociedade totalmente governada pela razão e pelos instrumentos tecnológicos. Na verdade, a sociedade de Oceânia, uma das três partes em que o mundo aparece dividido, em 1984, não usa a razão como um meio (como tem sido até aqui), mas como um fim.
« O poder não é um meio, é um fim. Não se instaura uma ditadura para se salvaguardar uma revolução; faz-se a revolução para se instaurar a ditadura. O objectivo da perseguição é a perseguição; o da tortura é a tortura; o do poder, o poder (...). Estás a pensar que eu falo de poder, e nem sequer consigo evitar a ruína do meu próprio corpo. Será que não entendes, Winston, que o indivíduo não passa de uma célula? O cansaço da célula está no vigor do organismo. Porventura morres quando cortas as unhas? (...) Somos os sacerdotes do poder. (...) Deus é o poder. (...) Sozinho, livre, o ser humano acaba sempre derrotado. E tem que ser assim, porque cada ser humano está condenado a morrer, o que constitui o maior de todos os fracassos. Mas se o homem for capaz de aceitar uma submissão total, absoluta, se for capaz de fugir à sua própria identidade, se for capaz de se fundir no Partido a ponto de ser o Partido, então será omnipotente e imortal. A segunda coisa que tens de perceber é que o poder é poder sobre os seres humanos. Sobre o corpo, claro, mas acima de tudo sobre o espírito. O poder sobre a matéria (sobre a realidade exterior, como tu dirias) não é importante. O nosso domínio sobre a matéria tornou-se já absoluto.(...) Começas agora a ver que tipo de mundo estamos a criar? Precisamente o oposto das estúpidas utopias hedonistas que os antigos reformadores imaginaram.(...) Não restará lealdade, senão a lealdade ao Partido. Nem amor, senão o amor pelo Big Brother. Nem riso, senão o riso da vitória sobre um inimigo aniquilado. Nem arte, literatura ou ciência.(...) Mas haverá sempre (não te esqueças disto, Winston), haverá sempre a embriaguez do poder,(...). Se queres uma imagem do futuro, pensa numa bota a pisar um rosto humano. Para sempre.»
Orwell. G. , Mil Novecentos e Oitenta e Quatro