Construção e organização de um discurso - Carlos Fontes


1. Construção do Discurso
A construção de um discurso argumentativo, susceptível de propiciar alguma adesão por parte do auditório, tem várias fases, cada uma com os seus requisitos. Aristóteles, Cícero, Quintiliano e muitos outros filósofos desde a antiguidade clássica procuraram construir um modelo para esta construção. Quase todos insistiram no facto de que o orador, não se pode limitar a escrever um bom discurso, deve também cuidar de muitos outros aspectos, como a sua postura na hora de o proferir.
Fases Fundamentais (Esquema clássico):
1ª. Parte: Invenção (heurésis). Em função do auditório e do assunto a debater procurava-se escolher o tipo de discurso, argumentos e estrutura argumentativa mais adequado.
2ª. Parte: Disposição (táxis). Organização interna do discurso, dando-se particular atenção à disposição dos argumentos de forma a conduzir o auditório a aceitação de uma dada conclusão.
3ª. Parte: Elocução (léxis). Redacção do discurso.
4º. Parte: Acção (hypókrisis). Pronunciação do discurso, onde a atenção é posta na actuação do orador, tom de voz, gestos, postura... de modo a criar uma empatia e receptividade no auditório para as suas teses.
2. A organização do discurso (táxis).
Foi objecto também de recomendações muito precisas. O modelo clássico apresenta três momentos fundamentais:
a) Introdução. Apresentação da tese e sua contextualização. Este momento é decisivo para captar a adesão do auditório.O orador deve partir coisas que não suscitem polémica, como factos, verdades, presunções ou até valores, de modo a gerar um primeiro acordo com o auditório, predispondo-o a aceitar as suas conclusões.
b) Argumentação. Apresentação dos argumentos que sustentam a tese. Antecipando possíveis críticas são também apresentados alguns contra-argumentos e feita a sua refutação. A ordem dos argumentos depende muito do auditório. Três alternativas possíveis:
- Ordem crescente. "O Inconveniente da ordem crescente é que, começando por por argumentos fracos, ela indisponha o auditório, tire brilho à imagem do orador, esmoreça o seu prestígio e a atenção que lhe é dada", Chain Perelman (Império Retórico)
- Ordem decrescente. " A ordem decrescente, terminando os discurso com os argumentos mais fracos, deixa ao auditórios uma má impressão, muitas vezes a única coisa que eles se lembram", Chain Perelman (Império Retórico)
- Ordem mista (nestoriana). Os argumentos mais fortes são colocados no princípio e no fim, sendo os restantes colocados no meio do discurso.
c) Conclusão. Síntese dos resultados atingidos que justificam a tese inicial.
3. Ordem dos Oradores
A organização de um discurso, pode estar dependente do facto do orador ser o primeiro ou o segundo a falar.
No caso de ser o primeiro, o seu discurso deve centrar-se nas suas teses, evitando envolver-se na refutação dos contra-argumentos do adversário. Se o fizer, não apenas chamará a atenção para os mesmos, mas também reforçará a sua lembrança.
No caso de ser o segundo, por exemplo, se vir que o orador que o precedeu impressionou vivamente o auditório, deve começar por rebater as suas teses, de forma a criar espaço para a aceitação das suas ideias.

Carlos Fontes in afilosofia.no.sapo.pt