A "loucura" da ciência - por Carlos Fiolhais

A associação das palavras “maluca” e “ciência” tem uma longa tradição na literatura de ficção, na banda desenhada e no cinema. Pois não é o perigoso Frankenstein o produto de um cientista louco? E o professor Tornesol das “Aventuras de Tintim” não é o protótipo do cientista tão genial como lunático? E não é ainda a “mente brilhante” do matemático John Nash ofuscada pelos seus ataques de esquizofrenia?
De facto, essa associação, embora decerto infeliz para a imagem da ciência, contém alguns laivos de verdade. Não que os cientistas sejam malucos. Os cientistas são tão loucos, lunáticos ou esquizofrénicos como a generalidade da população (há, por exemplo, estatísticas sobre a percentagem de esquizofrenia entre os cientistas, que está próxima da percentagem geral, o que só mostra que os cientistas são pessoas como as outras). Mas é forçoso reconhecer que a ciência contraria muitas vezes o senso comum e, se aceitarmos como definição de maluquice a fuga ao senso comum, não será completamente injusta a ideia do “cientista maluco”.
Quando a ciência contraria o senso comum, este sai normalmente derrotado. A atitude científica consiste precisamente em ir além do senso comum, em procurar descrições e explicações do mundo que não se justifiquem apenas pelas primeiras aparências mas que estejam antes solidificadas por evidência verificável. Um dos primeiros exemplos, e de certo modo um dos mais triviais, é a ideia de que a Terra se move em volta do Sol. Foi uma ideia maluca porque contrariava o senso comum, mas hoje ideia maluca é, evidentemente, a contrária.
Carlos Fiolhais in nove ideias malucas sobre ciência