Um mundo sem bússola - por Adriano Moreira

A publicar muito em breve
A perspectiva mais correta é admitir o globalismo como inspiração de pesquisa mais do que definição de
conhecimento adquirido e tentar entender componentes do pressentido todo, em geral identificados pelos efeitos nocivos na área limitada dos responsáveis pela governação.
A crise financeira e económica, a que também poderíamos acrescentar da paz, é global, provoca reflexos, eventualmente justificativos, nas áreas que estão socialmente à responsabilidade de governos ainda não submetidos a protectorado, mas a busca de receita para a defesa contra o agravamento, ou para a mais problemática recuperação, é regionalizada, como acontece na União Europeia, cada vez mais projectando uma imagem triangular: a Europa dos pobres, a Mittel Europa a sussurrar directório em prussiano, e a ortodoxa.
Na articulação procurada dos elementos visíveis do globalismo, os mediadores que procuram ajudar os povos com as indagações cujos resultados vão propondo, advertem cautelosamente que a economia mundial perdeu a estabilidade sem ter encontrado receita para a restabelecer, inquietam--se com uma possível guerra das moedas, mostram-se equívocos quanto ao futuro do euro, enquanto outros procuram definir uma nova polemologia que ultrapasse o complexo militar-industrial que não perde mais-valias, e perguntam-se se o Estado é ainda a invenção capaz de assegurar a governação na época dos povos que a democracia deveria caracterizar.
Acabam por verificar que mais de metade dos Estados existentes não possuem sequer capacidade suficiente para responder aos desmandos da natureza, tsunamis, inundações, terramotos, desastres técnicos, falta de reservas alimentares e de água, movimentos desordenados das migrações sem perspectivas, e total incapacidade de exercitar o princípio da precaução com resultados tranquilizadores.
Na parcela que é o Ocidente, em pregação destinada a pelo menos não separar os EUA da Europa, não apenas aqueles redescobrem o Pacífico como destino manifesto, e o Atlântico como uma retaguarda de longe em longe incómoda pelo recurso aos conflitos armados, como o Tratado de Lisboa, parece colocado em pousio, e quebra dos princípios de unidade e solidariedade, como é manifesta a descoordenação dos elementos constitutivos da cadeia de poder.
É evidente que a visão parcelar da zona árabe parece mais inquietante com a sua indefinível primavera, quando se vão conhecendo diariamente os procedimentos e confrontos entre as sociedades civis, os poderes na defensiva, e o futuro mal definido, enquanto as perdas de vidas, de bens, de dignidade se avolumam, com a Líbia, o Egipto, a Síria em plena tormenta, nada parecendo ao alcance do poder-dever de intervenção, que a ONU proclamou, e exerceu de regra rodeado de suspeição, com certamente os governos do Norte do Mediterrâneo, também a braços com a situação de pobreza em que mergulharam, a fazerem preces aos deuses das suas convicções para não terem de procurar migalhas nos desfalcados orçamentos para ao menos organizarem uma modesta prevenção.
Não é apenas na área da primavera muçulmana que as questões graves, que agudizam a pergunta sobre se o Estado que temos é capaz de governar o futuro das sociedades civis em mudança, afectam a circunstância da Europa, porque também a situação na Guiné, Moçambique e Brasil afectam a área da CPLP e, portanto, uma janela portuguesa do globalismo.
Entretanto, a ONU parece omitida pelo aglomerado das comunidades, o que enfraquece a sua definição de lugar onde todos falam com todos, onde o Conselho Económico e Social é esquecido como o responsável pela globalidade, incluindo os abusos dos expropriadores orientados pela ganância internacional, sem centros decisórios conhecidos, cobertos pela omissão da legalidade reguladora, e sem autoridade abordada pelo conhecimento das sociedades atingidas.
O único centro de diálogo de todos com todos não pode ser esquecido na situação de um mundo sem bússola.

Adriano Moreira in dn.pt