A actividade filosófica

É uma objecção pobre contra um filósofo dizer que é ininteligível. Ininteligibilidade é um conceito relativo, e aquilo que o Caio ou Ticiano frequentemente louvado não entende nem por isso é ininteligível. E mesmo a filosofia tem, de facto, algo que segundo a sua natureza sempre permanecerá ininteligível à grande multidão. Mas é algo inteiramente outro se a ininteligibilidade está na coisa mesma. - Ocorre frequentemente que cabeças que, com grande exercício e habilidade, mas sem possuírem propriamente inventividade para tarefas mecânicas, se dispõem, por exemplo, a inventar uma máquina de tornear garrafas - fabricam perfeitamente uma, mas o mecanismo é tão difícil e artificioso ou as engrenagens rangem tanto, que se prefere voltar a tornear garrafas com as mãos, à moda antiga. O mesmo pode perfeitamente passar-se na filosofia. O sofrimento com a ignorância sobre os objectos primeiros, sobre os maiores, para todos os homens que sentem, que não são embotados ou estreitamente auto-suficientes, é grande e pode aumentar até se tornar insuportável. Mas se o martírio de um sistema antinatural é maior do que aquele fardo da ignorância, prefere-se no entanto continuar a suportar este. Pode-se bem admitir que também a tarefa da filosofia, se é em geral resolúvel, tem de acabar por resolver-se com poucos traços, grandes e simples, e que não há-de ser sem valor, precisamente na maior das tarefas humanas, a invenção que se reconhece em todas as tarefas menores. 
Friedrich Schelling, in 'História da Filosofia Moderna