Estratégia global contra o terrorismo (problema esquecido/adiado?)

Depois do atentado contra as Torres Gémeas, um dos atos terroristas que mais afetou a atenção da opinião pública, não apenas espanhola, mas mundial, foi o que teve lugar, em 11 de março de 2004 em Madrid, sempre tendo por objeto, e finalidade, quebrar a relação de confiança entre a população e a estrutura governamental. Decorreu cerca de uma década, e vários textos, uns de escritores independentes, outros de instâncias oficiais, intentaram definir uma estratégia contra esse tremendo recurso ao terrorismo. (...)
O Club de Madrid, que reúne como membros antigos responsáveis pela chefia de Estados ou de Governos de todas as áreas culturais, assumiu uma atitude de projeção global, apelando aos governos, e incitando os povos, a apoiarem uma estratégia eficaz contra tamanha ameaça. Da lista numerosa de interventores, destacam-se, na reunião de então, não apenas o presidente do Club, Prof. Fernando Henrique Cardoso, mas Hamid Karzai, então Presidente da República Islâmica do Afeganistão, Igor Ivanov, então presidente do Conselho de Segurança da Federação Russa, Abdoulay Wade, então Presidente do Senegal, o attorney-general dos EUA, Alberto Gonzales, lavrando uma agenda com projeção mundial, destacando-se nos jornais a síntese no sentido de que - é urgente a unidade das Nações na luta contra o terrorismo.
O próprio Kofi Annan, então secretário-geral das Nações Unidas, procurou formular os princípios de uma estratégia global para combater o terrorismo, confiando como sempre na bondade humana, e por isso começando por incitar ao "convencimento dos grupos revoltados a não escolherem o terrorismo como tática". Pela mesma época os países que pertencem ao pouco citado grupo intitulado Euro-Mediterranean Partnership, como que antecipando o verdadeiro cemitério que é o Mediterrâneo, definiu um Código de Combate para conter o terrorismo, designadamente a rejeição de qualquer tentativa de o associar com "qualquer nação, cultura ou religião". Esta declaração de Barcelona, de Novembro de 1995, não pode deixar de ser lembrada quando os acontecimentos no Iraque, no Afeganistão, no Paquistão, no conflito israelo-árabe, no Sudão, o que parecem demonstrar é que o método alertou para o que já se vai chamando guerra dos povos, e também para forças governamentais ao serviço de lutas pela tomado do poder do Estado, ou redução das populações ao silêncio ordeiro contra abusos do poder.
Se a Jurisdição Penal Internacional proceder a uma leitura atualizada dos seus estatutos, sem governo que se julgue habilitado para orientações jurisprudências, o sentido das suas competências tenderá para ultrapassar legalmente as suas tradicionais capacidades. Sobretudo existem pelo menos dois factos que aconselham a que não sejam apenas instâncias intelectuais, como o Club de Madrid, ou de diálogo como o Grupo Euro-Mediterrânico, que intervêm com opiniões mobilizadoras da atitude internacional dos povos: um deles, já com manifestações políticas, é a definição por Estados de fronteiras de interesse, contra as quais não se registam oposições a respeitar: outro, agora com demonstração aguda no Iraque, e expansionismo nas margens do Mediterrâneo, que é a inclusão de valores religiosos no conceito estratégico dos exércitos, adotando uma das práticas mais temíveis do terrorismo que atingiu as Torres Gémeas e Madrid.
O adormecimento dos órgãos transnacionais, em que se destaca o Conselho Económico e Social da ONU, em relação à crise económica e financeira mundial, começa a exigir reflexão sobre o contágio do método que ameaça verificar-se.
Adriano Moreira in dn.pt