Lógica e argumentação

Diz-se, por vezes, que a lógica é o estudo dos argumentos válidos; é uma tentativa sistemática para
distinguir os argumentos válidos dos inválidos. Neste estádio, tal caracterização tem o defeito de explicar o obscuro em termos do igualmente obscuro. O que é afinal a validade? Ou, já agora, o que é um argumento? Para começar pela última noção, mais fácil, podemos dizer que um argumento tem uma ou mais premissas e uma conclusão. Ao avançar um argumento, damos a entender que a premissa ou premissas apoiam a conclusão. Esta relação de apoio é habitualmente assinalada pelo uso de expressões como “logo”, “assim”, “consequentemente”, “portanto, como vês”. Considere-se esse velho e aborrecido exemplo de argumento:

Sócrates é um homem.
Todos os homens são mortais.
Logo, Sócrates é mortal.

As premissas são “Sócrates é um homem” e “Todos os homens são mortais”. “Logo” é o sinal de um argumento e a conclusão é “Sócrates é mortal”.
A vida real nunca é tão evidente e inequívoca como seria se todas as pessoas falassem da maneira como falariam se tivessem lido manuais de lógica a mais numa idade facilmente impressionável. Por exemplo, muitas vezes avançamos argumentos sem apresentar todas as nossas premissas.

Icabod teve negativa.
Logo, não pode passar de ano.

Neste argumento está implícita aquilo a que chamamos uma premissa suprimida;nomeadamente, a de que nenhum estudante que tenha negativa passa de ano. Pode ser tão óbvio, pelo contexto, qual a premissa que está a ser pressuposta, que seja pura e simplesmente demasiado aborrecido formulá-la explicitamente. Formular explicitamente premissas que fazem parte do pano de fundo de premissas partilhadas é uma forma de pedantismo. Contudo, temos de ter em mente que qualquer argumento efectivamente usado pode ter uma premissa suprimida que tenha de se explicitar para que possa ser rigorosamente analisado. Em nome do rigor completo, praticaremos neste estudo um certo grau de pedantismo.
Regressaremos a outras questões acerca da natureza dos argumentos depois de uma primeira caracterização da noção de validade. Com este fim em vista, considere- se os seguintes pequenos argumentos simples:

I

O céu é azul e a relva verde.
Logo, o céu é azul.

Todos os estudantes do Balliol College são inteligentes.
Icabod é um estudante do Balliol College.
Logo, Icabod é inteligente.

II

Ou o céu é azul, ou a relva é cor de laranja.
Logo, a relva é cor de laranja.

Icabod é inteligente.
Icabod estuda no Balliol College.
Logo, todos os estudantes do Balliol College são inteligentes.

Há qualquer coisa de infeliz nos argumentos apresentados no grupo II. Podemos imaginar contextos nos quais as premissas seriam verdadeiras e a conclusão falsa. Os argumentos do grupo I têm conclusões verdadeiras sempre que têm premissas verdadeiras. Diremos que são válidos. Isso significa que têm a seguinte propriedade: desde que a(s) premissa(s) seja(m) verdadeira(s), a conclusão será verdadeira. Os argumentos do grupo I têm claramente esta propriedade. Como poderia alguma vez acontecer que o céu fosse azul e a relva verde, sem que o céu fosse azul? Não há maneira nenhuma de Icabod estudar no Balliol College e de todos os estudantes do Balliol College serem inteligentes sem que Icabod seja inteligente. Os argumentos de II carecem da propriedade da validade. As circunstâncias efectivas do mundo fazem com que a premissa do primeiro argumento do grupo II seja verdadeira, mas a conclusão é falsa. E no caso do segundo argumento do grupo II, podemos imaginar circunstâncias nas quais seja verdade que Icabod é inteligente e estuda no Balliol College, mas nas quais (infelizmente) existam outros estudantes não inteligentes cujos espíritos obtusos tornem a conclusão falsa. A lógica é o estudo sistemático dos argumentos válidos. Isto quer dizer que iremos desenvolver técnicas rigorosas para determinar quais os argumentos que são válidos.
W. H. Newton-Smith