A mensagem tácita do terrorismo

"Descobrimos então que os terroristas estão interessados em dois tipos de mensagens. Primeiro e isto é habitualmente a única pretensão à verdade reconhecida por todos os outros, o terrorista alega que existem injustiças sociais. Em muitos casos pode haver alguma verdade nas alegações específicas feitas pelos grupos terroristas, e isso seria suficiente para os virar contra todos aqueles que beneficiam do regime que está no poder. Mas a própria conduta dos terroristas coloca-nos perante um segundo tipo de verdade. Talvez exista algo profundamente errado não só em algumas das políticas específicas da nossa sociedade, mas também na forma como concebemos o uso institucionalizado da força mortífera, a actividade da guerra, como um meio aceitável de resolução de conflitos.
As conotações associadas ao “terrorismo” são fortemente pejorativas e, embora os terroristas operem claramente a partir daquilo que consideram ser moral, são frequentemente sujeitos a uma condenação muito mais poderosa do que os assassinos não-políticos. Mas os assassinos que rejeitam a própria ideia de moralidade parecem ser piores inimigos da sociedade do que os terroristas políticos, que são motivados primariamente por considerações morais. Então porque será que as pessoas temem e odeiam tão intensamente os terroristas? Talvez por reconhecerem de alguma forma que os terroristas têm de facto operado segundo formas que essa sociedade implicitamente desculpa e até encoraja. Talvez as pessoas sejam meras sombras de si próprias e das actividades dos terroristas.
Se é verdade que os terroristas se vêem a si próprios como defensores da justiça, então a menos que a atitude relativamente à guerra assumida pela maior parte dos governos do mundo mude radicalmente, deve esperar-se que o terrorismo continue a existir. A proliferação dos conflitos é proporcional à dos grupos e algum subconjunto das partes do conflito acabará eventualmente por recorrer à força mortífera, com base naquilo que eles, em conjunto com a maioria da população, consideram a respeitabilidade da “guerra justa”. As soluções militares já não são usadas por nações estáveis mesmo “em último recurso”. Tragicamente, a disponibilidade imediata de armas mortíferas e a presunção disseminada de que o uso dessas armas é com frequência moralmente aceitável, se não obrigatório, resultou num mundo em que os seus líderes pensam frequentemente em primeiro lugar, mas não em último, em soluções militares para os conflitos. Esta disponibilidade para recorrer a meios mortíferos contribuiu indiscutivelmente para a escalada de violência no mundo contemporâneo em graus diversos, sendo os mais assustadores para as pessoas os que envolvem acções imprevisíveis de grupos facciosos, “os terroristas”. Mas os líderes das nações estabelecidas iludem-se ao pensar que podem sufocar o terrorismo através de ameaças e da proliferação de armas. O terrorismo “inova-se” ao transformar em alvos militares o que habitualmente se consideravam alvos não-militares. Não há razão para acreditar que a capacidade de inovação dos terroristas será frustrada através da construção de um sistema de mísseis anti-balísticos ou da implementação de outras iniciativas baseadas em estratégias e práticas militares convencionais.”
Laurie Calhoun, "The Terrorist's Tacit Message" in White, James E. (2006). Contemporary Moral Problems: War and Terrorism. Belmont: Thompson Wadsworth, pp. 47-53 (Traduzido e adaptado por Vítor João Oliveira)