O mais importante, por favor

A democracia liberal e o Estado de direito são frágeis. Alguns dos seus princípios fundamentais são, em si mesmos, as razões das suas fragilidades. A liberdade de expressão e a própria liberdade de fazer propostas que colidem com esses princípios são alguns exemplos: não há democracia sem eles, mas são também essas liberdades que permitem a defesa e a divulgação de ideias contra os seus mais importantes institutos. Também por causa dessas fragilidades, nunca a sua defesa e a defesa dos seus mais sagrados fundamentos devem ser descurados, mesmo quando parecem estar solidamente instituídos e consolidados.
A ninguém escapará que as épocas de grandes dificuldades económicas são especialmente perigosas - a história europeia do século XX lembra-nos bem disso. Tudo se torna secundário quando não se encontra emprego ou não se consegue sustentar a família e a fome e o desespero tornam os cidadãos bem mais vulneráveis aos vendedores de quimeras. É exatamente nesses momentos que a defesa dos princípios fundamentais da democracia liberal e do Estado de direito deve ser mais intransigente.
Mas não é preciso vivermos situações-limite para que sejam postos em causa esses valores. E, demasiadas vezes, por pessoas eleitas democraticamente e com, provavelmente, as melhores intenções, gente até que ficará muito ofendida se for acusada de ataques à democracia - claro está, a ignorância ocupa aqui um lugar que nunca deve ser desprezado.
Hoje, em Portugal, vivemos um período desses. Em que se põem em causa, de uma forma clara, princípios sagrados do Estado de direito e da democracia liberal. E o mais grave é não serem apenas pessoas que atuam nas margens do sistema, populistas descarados ou anunciantes do apocalipse, é sim esse ataque vir em larga medida de detentores do poder político e judicial.
(artigo parcial) Pedro Marques Lopes in dn.pt