Os princípios da razão

A lógica assenta em três princípios fundamentais, sem os quais não haveria pensamento possível. Como todos os raciocínios se fundamentam nestes princípios, interessa falar deles. (...) A lógica clássica [aristotélica] formula-os em termos de “coisas”, enquanto a lógica moderna e a logística os exprimem em termos de proposições. 
Daremos as duas espécies de enunciados. 
1- Princípio de identidade 
Enunciados do princípio de identidade:
I- Uma coisa é o que é. 
II- O que é, é; o que não é, não é. 
III- A é A (“A” designando qualquer objecto do pensamento). 
Em termos de proposições: 
IV- Uma proposição é equivalente a si mesma. 
2- Princípio de não contradição e a negação das proposições 
I - Uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo, segundo uma mesma perspectiva. (...) Não há contradição quando a realidade de que falamos não é julgada, quer num mesmo instante, quer num mesmo ponto de vista, mesmo quando se obtêm juízos que se opõem. Exemplo: “Este camaleão é verde e cinco minutos mais tarde este camaleão é castanho”. Os dois juízos não são contraditórios, visto que não se referem ao animal encarado num mesmo momento e que o camaleão pôde mudar de cor, entretanto, por mimetismo. Se dissermos 2 x 3 = 6 e 2 x 3 não são 6, há, evidentemente, contradição, ou, de outro modo, infringiu-se o princípio de contradição; com efeito, as duas proposições não são encaradas segundo perspectivas diferentes e, além disso, o tempo não intervém no domínio das matemáticas, pois estas são imutáveis. Em termos de proposições: 
II- Uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo (...). 
III- Uma proposição e a sua negação não podem ser simultaneamente verdadeiras.
IV- Duas proposições contraditórias não podem ser ambas verdadeiras. 
3- Princípio do terceiro excluído 
I - Uma coisa deve ser, ou então não ser; não há uma terceira possibilidade (o terceiro é excluído). Em termos de proposições, temos os enunciados:
II- Uma proposição é verdadeira, ou então é falsa; não há outra possibilidade. Introduzindo a negação: 
III- Se encararmos uma proposição e a sua negação, uma é verdadeira e a outra é falsa, não há meio termo. Em termos de proposições contraditórias, temos: 
IV- De duas proposições contraditórias, se uma é verdadeira, a outra é falsa, e se uma é falsa, a outra é verdadeira, não há meio termo.
Solidariedade dos três princípios
(...) Numa lógica bivalente em que todo o juízo é necessariamente verdadeiro ou falso, como a lógica clássica e a logística sob a sua forma actual, os três princípios fundamentais da lógica são estreitamente solidários; não são verdadeiramente três princípios distintos mas três aspectos, três formulações de uma mesma exigência. Enunciamo-la do seguinte modo: Duas proposições contraditórias, quer dizer, que são a negação uma da outra, não podem ser nem ambas verdadeiras nem ambas falsas; se uma é verdadeira, a outra é falsa, e, reciprocamente, se uma é falsa, a outra é verdadeira. Este princípio único de três modalidades serve para garantir o funcionamento do pensamento, o uso do verdadeiro e do falso, de modo que o edifício intelectual que o pensamento engendra não se destrua a si mesmo. Noutros termos, este princípio garante a coerência do pensamento e impede-o de se contradizer. Diz-se de uma teoria que é contraditória se ela permite demonstrar simultaneamente uma proposição “p” e a sua negação “~ p”. Por meio de uma tal teoria, podemos demonstrar qualquer coisa. É absolutamente desprovida de consistência e, por isso, inútil. Nela o próprio pensamento se destrói”.
MAURICE GEX, Logique Formelle, Neuchatel, Ed. du Griffon, 1968, p. 71 e segs.