A Europa que não quero!

Falta grandeza à generalidade das lideranças europeias, a grandeza que só a educação para o outro e para os valores humanos e uma sólida cultura sustentam!
A União Europeia, para se afirmar como poder à escala mundial, já deveria ter resolvido, ou ter numa fase avançada de resolução, os problemas das pessoas em termos de igualdade e mobilidade sem fronteiras e uma integração significativa dos serviços, do comércio e dos capitais. Contudo, é cada vez mais notória a falta de investimento robusto e continuado em políticas solidárias dirigidas para a coesão social e capazes de “puxar” pelos povos e nações que, tendo passado a integrar a União Europeia, não viram cumprir-se as suas expectativas de convergência com os padrões médios de desenvolvimento sócio-económico da União.
No processo de integração europeia tem faltado uma visão clara do que é essencial e do que é acessório, de que foi exemplo caricatural o estranho e excessivo investimento de energia e de recursos na uniformização da côr dos táxis. Tem mandado e preponderado a burocracia, onde devia mandar a política orientada pela razão clara! Tem faltado a capacidade para corrigir trajectos menos avisados, mesmo quando pais fundadores da União alertaram para erros e consequências.
Foi o caso de Jean Monet, que terá dito, já numa fase avançada da sua vida, que "se voltasse ao princípio (da construção da União Europeia), recomeçaria pela educação (ou pela cultura?). E foi o caso de Robert Schuman, quando exclamou, ao avaliar o resultado alcançado: "Il lui faut une âme” (falta-lhe uma alma)! Na plenitude da sabedoria, não poderiam chegar a outra conclusão, certamente porque, também para eles, só a educação pode dar à pessoa, a cada pessoa, uma dimensão humana!
A falta de um trajecto claro a favor da integração social e económica, o défice de legitimação democrática de muitos dos patamares de decisão, a ausência (voluntária?) de travagem, em tempo útil, de um excessivo crescimento das dívidas soberanas e a iniquidade extrema na distribuição da riqueza gerada, entre outros factores, só podiam conduzir a um profundo mal-estar das pessoas, à desconfiança nas instituições e nos políticos, a nacionalismos em crescendo, a populismos que já batem à porta do poder, a ameaças de construção de novos muros e de reposição de controlos em fronteiras internas que ignoram Schengen, a um encolher de ombros face a atentados contra a separação de poderes na Hungria ou a liberdade de imprensa na Polónia, a um Reino Unido a ameaçar sair da União se não forem atendidos interesses nacionais de excepção a seu favor!
Hoje, falta grandeza à generalidade das lideranças europeias, a grandeza que só a educação para o outro e para os valores humanos e uma sólida cultura sustentam! Assim, conformam-se com o alcance utilitário (logo imediato) do seu agir político. Hoje, como aconteceu recentemente em Itália, os líderes europeus não coram de vergonha quando ocultam obras de arte que antevêem como potencialmente “obscenas” aos olhos de líderes com diferente educação e cultura que os visitam. Saberá Deus em favor de quê!... E esperando o simples cidadão que o encobrimento de obras sublimes do génio humano ocorra por razões bem mais ponderosas do que a venda de umas centenas de aviões!...

Fernando J. Regateiro in rr.sapo.pt